Em festa de purpurina, cinza é penetra... Ao carnaval, com seus excessos e sua necessária suspensão da ordem, segue-se, na tradição judaico-cristã, a celebração da pequenez e do recolhimento, simbolizados pelas cinzas.
Atrás do trio elétrico não se discute finitude. Os abadás criam a ilusão da eterna juventude e da alegria inconsequente, regadas a confete, serpentina, e otras cositas más. As máscaras só caem na quarta, que teima em nos lembrar: somos pó e ao pó haveremos de voltar.
Pulsão de vida versus pulsão de morte. Canto, riso e festa versus recolhimento, penitência e arrependimento. Eis o drama multissecular, que remonta, no Brasil, aos tempos coloniais. Tem sempre um estraga prazeres para, plena terça, avisar que o fim é próximo...
Sobre seus altares o carnaval dispôs hinos, ídolos e promessas... arrebatando corações e mentes. Discreta, a quarta-feira de cinzas, tenta se achegar. Alguém aí disposto a uma vênia sequer à inexorável fragilidade da existência humana? O Ibope é menor...
Findo o reinado de Momo, retoma-se o de Narciso e a vida segue, fútil e adoecida. Quem há de negar que a cura possa estar justamente no discreto ritual, marcado pela queima de ervas cujo borralho vem se sobrepor ao glitter, num recado claro: baixa a bola... baixa a bola...?
Evandro Albuquerque de Andrade é filósofo e coordena o SOR – Serviço de Orientação Religiosa do Colégio Sagrado Coração de Maria de Ubá
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